Clima e política
01/11/12 18:20CONTINUANDO A CONVERSA sobre a ligação entre o clima extremo e o aquecimento global, vou retificar um palpite que eu havia dado. Minha opinião era a de que a tempestade Sandy tinha chegado tarde demais para interferir na eleição presidencial, mas eu estava errado.
O prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, um independente que vinha até aqui criticando tando Romney quanto Obama, decidiu endossar o voto em favor da reeleição do atual presidente, na última hora, citando sua posição sobre mudança climática como o motivo.
Em um editorial no site Bloomberg View, que congrega produtos de seu império de mídia, ele detalhou os motivos de sua decisão:
“A devastação que o furacão Sandy trouxe à cidade de Nova York e boa parte do Nordeste —em vidas perdidas, lares perdidos e negócios perdidos— deu alto relevo àquilo que está em jogo na eleição presidencial de terça-feira”, escreveu.
“Nosso clima está mudando”, continou. “Se o crescimento do clima extremo que vivenciamos em Nova York pode ou não ser resultado disso, o risco que de que possa ser —dada a devastação desta semana— deve compelir todos os líderes a tomarem ação imediata.”
A ironia aqui é que Bloomberg, de certo modo, pode estar fazendo a coisa certa pelos motivos errados.
Primeiro, porque apesar de o risco de eventos climáticos extremos ocorrerem estar subindo, a tempestade que assolou Nova York e Nova Jersey não pode ser diretamente atribuída ao aquecimento global (isso é a discussão complicada da qual tratei no último post).
Segundo, porque ainda não está claro o quanto Obama está disposto a tomar decisões no plano internacional que realmente farão as emissões americanas de gases estufa terem uma curva de redução significativa. Aumentar as exigências para a indústria automotiva é bom, e trocar usinas a carvão por gás também é algo positivo, mas o que climatólogos estão pedindo requer esforço uma ordem de grandeza acima.
No editorial, Bloomberg também elogiou Romney por ter promovido um sistema de cap-and-trade para negociar créditos de carbono quando era governador em Massachusetts, mas criticou-o por mudar de rumo durante a corrida presidencial, na qual passou a questionar as evidências do aquecimento global. As declarações de Bloomberg serão extremamente bem vindas se derem força a um movimento interno entre os republicanos que busca reconhecer os perigos da mudança climática. Chris Christie, governador de Nova Jersey –que elogiou ontem a ação de Obama durante a tempestade–, é um serio candidato a aderir.
Por qualquer motivo que seja, ganhar o apoio do prefeito da cidade mais famosa do mundo é certamente positivo para a causa da redução de emissões de gases estufa. Nova York provavelmente se beneficiaria disso, no longo prazo, caso um século adiante tenhamos conseguido evitar o pior da mudança climática. E o resto do mundo também.
Por fim, ainda não é claro se declarações do prefeito de Nova York vão afetar a votação de estados-pêndulo como Ohio, Flórida e Colorado, onde a eleição será efetivamente decidida. Diante do imprevisível comportamento do eleitor americano e das maluquices das regras eleitorais, tudo pode acontecer numa votação acirrada como esta. Mas a mudança no debate sobre clima tem agora a chance de tomar um caminho positivo.
Olá Rafael,
Em finais de 2008 eu e um colega de trabalho discutiamos se Obama iria mesmo implementar as medidas que os grupos que o apoiavam exigiam em relação ao clima. Minha posição era que ele não iria, pois isto significaria quebrar o já debilitado EUA, que enfrentava a crise mundial de 2008. Menos de um ano depois, em Copenhagen, Obama sinalizou que nenhuma medida “agressiva” seria tomada.
Algumas coisas foram feitas sim, como o estímulo às energias renováveis, como solar e eólica. Entretanto, grande parte destes empreendimentos quebraram (Solyndra é apenas um entre muitos). Os carros elétricos ainda são uma promessa, e acessíveis apenas para quem tem dinheiro. Mesmo assim, continuam ineficientes e inseguros. Talvez, quem sabe, o carro hibrido. Mas apenas como maquiagem midiática, pois não serão eles que vão contribuir para a queda ou a estabilização das temperaturas mundiais. Nem os “eco-cruxifixos” que colocam os EUA para fazer roleta-russa energética (wind farms) darão qualquer retorno climático.
Obama não podia errar (por ser afro-descendente). Assim como Lula não podia (por ter origem humilde e ter emergido do movimento trabalhista). Assim como Dilma não pode (por ser a primeira mulher a assumir a presidência da nação). Se eleito para um segundo mandato, entretanto, é possível que ele tome medidas mais agressivas, já que dificilmente terá um terceiro mandato. Isto se ele não ficar ressentido com os radicais climáticos que ultimamente tem chamado ele até de covarde.
Cerca de 4/5 anos atrás, quando uma tragédia climática (excesso de chuvas) aconteceu em uma cidade do sul do Brasil, o governador do estado apressou-se em culpar o aquecimento global. Ao olhar com uma lupa, entretanto, a culpa na verdade não era do “”clima cada vez mais extremo” já que o fenômeno é recorrente na região desde que ela começou a ser colonizada. A culpa era a ausência do estado na condução de políticas públicas que impediriam a ocupação de áreas de alto risco, assim como a ação antrópica nas encostas dos morros. Não falou-se mais no assunto.
O aquecimento global tornou-se, de fato, uma boa desculpa para a omissão do estado nestas questões. Roger Pielke Jr pronunciou-se a respeito da posição de Bloomberg (http://rogerpielkejr.blogspot.com.br/2012/11/mayor-bloombergs-deft-climate-politics.html). Considerando seus argumentos sobre a tendência e o risco estatístico de furacões atingirem NY, acho que o contorno da questão não é diferente do episódio que aconteceu no sul do Brasil. Vamos admitir: a desculpa é perfeita.
Sds,
Viktor
Concordo Viktor, a 4 anos atrás aqui em Blumenau-SC onde moro, em nov/08 não foi somente enchente (algo crônico aqui) mas fortes deslizamentos de morros, agravados pela ocupação crescente dessas áreas. Mas vemos este fenômeno acontecer nesta época de verão-chuvas, quase todo ano nas encostas do Rio de Janeiro.