A peça de DNA no quebra-cabeça do autismo
06/04/12 17:17Deixei passar batido nesta semana o dia da consciência do autismo, mas quero tentar me redimir antes que a semana acabe. Só agora tive tempo de olhar os resultados dos últimos estudos que saíram sobre o assunto nesta semana. O tema mais quente foi o anúncio de um avanço sem precedentes na compreensão das raízes genéticas desse transtorno psiquiátrico, caracterizado pela dificuldade de comunicação/sociabilidade e comportamento compulsivo.
Um conjunto de estudos foi publicado pela revista “Nature”, na qual grupos de pesquisa independentes mostraram correlações fortes entre o autismo em pelo menos quatro genes diferentes. O principal método foi a busca de mutações genéticas “novas” entre os portadores do transtorno. Ou seja, os cientistas procuraram alterações no DNA que existiam em crianças autistas, mas que não exsitiam em seus pais ou irmãos.
Um dos estudos novos, liderado por Evan Eichler, da Universidade de Washington em Seattle, mostrou que homens que se tornam pais em idade mais avançada estão sob risco um pouco maior de ter filhos autistas. A razão para isso é provavelmete o aumento da instabilidade no DNA dos espermatozóides, que os torna suscetíveis a alterações imprevistas.
As novas mutações descobertas, porém, são muito raras, e não vão ter impacto direto no diagnóstico do problema. Provavelmente não são relevantes sozinhas dentro da incidência total de autismo. Esse conhecimento, porém, será de valor inestimável para cientistas que estudam desenvolvimento neurológico e tentam entender o que ocorre de errado nos cérebros de crianças com o transtorno. Os genes dão pistas sobre proteínas que carregam as instruções biológicas para o desenvolvimento do sistema nervoso, e entender detalhes desse processo será necessário à criação de diagnósticos mais precoces e tratamentos mais eficazes.
Há uma longa estrada a percorrer, certamente, e os estudos na “Nature”, apesar de otimistas, dão uma amostra de como isso será difícil.
Um dos novos trabalhos, liderado pelo geneticista Mathew State, da Universidade Yale, precisou sequenciar o DNA de 928 pessoas para obter resultados convincentes. O estudo aponta várias mutações em genes que são ativos no cérebro, mas foram associadas apenas de forma não determinística ao autismo. O cientista conseguiu descobrir um único gene, identificado pela sigla SCN2A, que estava danificado em dois pacientes de autismo. Nesse caso, é altamente provável que mutações ali exerçam um fator de peso na doença.
State e Eichler, cruzando informações, ainda acharam outros dois genes (CHD8 e NTNG1) para os quais mutações novas tinham ocorrido apenas em pacientes de autismo. A descoberta foi reforçada por Mark Daly, da Universidade Harvard, que encontrou ainda mais um gene forte candidato a envolvimento com autismo (KATNAL2).
É possível, porém, que a maioria dos genes correlacionados com a doença não exerça influência definitiva. A soma de várias mutações pode ser aquilo que desequilibra o desenvolvimento cerebral dos pacientes. O ambiente em que a criança cresce pode ganhar peso maior, dependendo do caso. Isso, ao lado da dificuldade de se estudar mutações novas, força os geneticistas a trabalharem com amostras muito grandes de pacientes na tentativa de enxergar algo significativo. Um outro problema é a constatação cada vez mais evidente de que o autismo não é uma doença única.
Tomemos o exemplo da chamada síndrome de Rett. Essa é uma forma do transtorno _uma “doença de espectro do autismo”_ causada por mutações em um único gene. Não há razão para duvidar que seja totalmente originada no DNA. Contudo, em cerca de 70% das ocorrências de autismo (os casos ditos “esporádicos”) o fundo genético é desconhecido, e mecanismos biológicos também também não são muito compreendidos. Não é à toa que os critérios para diagnóstico ainda são motivo de intensa discussão entre psiquiatras.
Quantos genes estão envolvidos no autismo? Dezenas? Centenas? Como progredir diante de um cenário tão complexo? Tenho admiração pelos cientistas que não ficam desanimados só de olhar para o quebra-cabeça colossal que é a biologia do autismo. A duras penas, Eichler, State, Daly e suas equipes parecem ter conseguido encaixar algumas peças desta vez.
PS. Deixei de fora deste post alguns aspectos importantes do assunto que já haviam sido explorados aqui na casa. Luciana Saddi, psicanalista e colunista da Folha, escreveu em seu blog sobre a influência do ambiente de criação no autismo e sobre tratamentos atuais.
Homens que se tornam pais em idade avançada? qual é essa idade? meu marido se tornou pai de nosso filho autista aos 37 anos, e a maioria de pais que conheço se tornou pai na faixa de 25 a 35. De qualquer modo, meu filho tem 21 anos, e espero que esses cientistas não desanimem em montar esse quebra-cabeças, de uma doença que tem mil faces, evoluções diferentes, por isso se torna muito perversa!
Oi, Célia. A idade de referência que eles usaram no estudo foi de 35 anos. Eles não detalharam muito isso, porém, porque não era o objetivo principal do trabalho deles. O estudo de referência que eles citam é este que eu estou deixando no link aqui abaixo, segundo o qual o risco de um homem com mais de 50 anos ter um filho autista é o dobro do de um com menos de 30. Isso é uma estimativa sobre o risco, porém, e não uma explicação para a causa da doença. Não é uma coisa para deixar em pânico casais mais velhos que queiram ter filhos nem para deixar os pais de crianças autistas encucados, pois não é um fator determinante. Acho que os cientistas usaram o termo sem intenção de fazer nenhum julgamento. Pelo critério deles, eu, que tenho 37 anos, também já tenho “idade avançada”.
O estudo original sobre risco associado à idade é este aqui, que saiu no fim do ano passado:
http://www.nature.com/mp/journal/v16/n12/full/mp2010121a.html?WT.ec_id=MP-201112
” uma doença que tem mil faces, evoluções diferentes” , não é uma doença – é uma característica humana.
Concordo totalmente com teu comentario, Robert. Meu primeiro comentario (abaixo) levanta a questao do preconceito contra essas pessoas. Sao pessoas cujo cerebro funcionam de uma forma diferente da maioria e nao se trata de doenca.
De fato, são muitas as buscas por explicações orgânicas para o autismo! Mas hoje o que temos são os avanços conseguidos através de tratamentos, e não de prevenção. O Ministério da Saúde encomendou uma pesquisa para capacitar pediatras a identificar sinais de autismo, coordenada e desenvolvida por uma equipe de psicanalistas. Quer dizer, perceber na relação entre mãe/pai e filho o que ali não está operando para que esse sujeito venha a se inscrever na linguagem, no simbólico. Sim, pois muito se fala da genética, enquanto a psicanálise continua pesquisando e tratando crianças autistas, assim como a seus pais. Às vezes parece mais fácil lidar com a questão se o problema estiver nos genes, no cérebro. Na verdade, é mesmo mais fácil tomar um remédio, evitar uma gravidez… Porém, quando o problema se localiza na relação com o outro, e então no próprio sujeito enquanto sujeito de si e de suas escolhas, a gente muitas vezes não quer saber!
Olá Rafael, mais uma vez parabéns pelo belo texto.
Os avanços tecnológicos da engenharia genética pode nos permitir enquanto espécie humana, grandes avanços. Desejo voltar a trabalhar nesta área, especialmente com epigenética, muito provavelmente você já deve ter lido algo a respeito.
Mas como o próprio estudo demostrou existe muito trabalho pela frente. Então, meus caros cientistas, mãos à obra.
Pelo texto e belo tema.
Ps.: Rafael, no penúltimo parágrafo, “… e mecanismos biológicos também também não são muito compreendidos…” a palavra também ficou duplicada.
Grande abraço.
Outro aspecto importante a comentar sobre o autismo sindrome de down, eh que devemos lutar contra o preconceito na sociedade em relação a essas pessoas. Os cientistas estao fazendo a parte dele e todos nos precisamos fazer a nossa para acabar com a ignorância do preconceito. Precisamos educar as pessoas de que na realidade ha uma diversidade de cérebros e nao anormalidades. E mais, essa diversidade de cérebros eh importante para sociedade pois essas pessoas claro tem muito que aprender e ensinar como todos nos.
Minha experiência com essas pessoas é algo de especialíssimo. Não os vejo como doentes de forma alguma, mas como pessoas que tem uma pureza de alma elevadíssima, sem precedentes, pois não conseguem conceber mentiras, dissimulações, manipulações. São autênticos filhos de Deus, e tem uma dificuldade enorme em compreender as energias que emanam das pessoas com sérios desvios existenciais, pessoas que mentem, manipulam e dissimulam com frequência.
Infelizmente um dos pais sempre apresenta essas características e fazem com que a criança se “blinde” emocionalmente no seu mundo. O pai mais próximo de Deus, o faz sair, mas o jogo entre o “justo” de um dos pais e o “ruim e indesejável” do outro o confunde, e ela acaba preferindo “se desligar”.
Autistas tem características absolutamente espirituais no seu comportamento, e não tem nada haver com “espiritismo”. Tenho certeza absoluta do que estou dizendo, e recomendo fortemente aos pais que se voltem para o cristianismo bíblico sem frequentarem nenhuma igreja, para ajudarem a seu filho e a si mesmos. Fraterno abraço.
Experiências religiosas a parte, o transtornos do espectro autista são alterações comportamentais com comorbidades importantes.Deve ter uma equipe multiprofissional presente, sempre, cuidando da criança e ajudando a sua transição nas diversas fases da vida.
Os rótulos na saúde mental só atrapalham.
Concordo plenamente com vc.
E nem poderia deixar de ser assim para o pouquíssimo e irrisório tempo de vida que temos aqui nesse mundo ao compararmos com a amplitude do termo “eternidade” que é o que espera essas doces (aos olhos de Deus) criaturas.
Claro que importa vê-las mesmo nesse curtíssimo tempo interagindo de forma a não sofrerem por exageradas perseguições dos maléficos seres humanos mentirosos, dissimuladores e manipuladores que as rodeiam. Melhor é aprender a se defender mais eficientemente no utilizarem seus sofisticados sistemas de blindagem nos momentos certos para não se verem em encrencas. Esse é mais um dos dons que Deus dá a elas.
Essa recomendação de recorrer ao cristianismo bíblico eh completamente absurda e sem lógica. O que de pior poderia acontecer para qualquer criança autista ou nao eh meterem dogmas e superstições na sua mente. Uma criança autista precisa de orientação baseada em ciência para que ela desenvolva todo seu potencial de aprendizado e raciocínio. Por favor nao queiram demonizar e nem endeusar os autistas pois eles sao exatamente humanos como todos nos.
Compreendo que vc não compreenda. Lamento.
Queria entender por que sempre que falam em autismo fazem referência a crianças autistas como se elas nunca fossem crescer e ter problemas sérios por causa desse problema. Tenho 37 anos, uma vida no esgoto e não sei mais a quem procurar, porque parece que ninguém faz estudos nem se importa e nem sabe o que fazer com o autista já adulto.
Rodrigo, não pense assim. Mais uns dias e vc verá grandes transformações na humanidade. Mais alguns dias apenas… tenha paciência e acredite que tem um Deus extremamente poderoso que não gosta de mentirosos e conversinhas e está chegando para por ordem nessa absurda bagunça de mundo em que vivemos. Aguente firme!