Emagreça comendo chocolate. Ou não.
26/03/12 22:34Sempre que a Páscoa se aproxima, começam a aparecer estudos de nutrição sobre consumo de chocolate. O primeiro da safra deste ano saiu faltando três semanas para o feriado, com uma conclusão bem radical: “Adultos que consomem chocolate com mais frequência têm índice de massa corporal menor”.
Como muitos desses estudos são patrocinados pela indústria confeiteira, a primeira coisa a fazer é verificar se os autores declaram conflito de interesse. E desta vez passou: o trabalho com a alegação acima está na edição de hoje da “Archives of Internal Medicine”, revista respeitável publicada pela Associação Médica Americana, que exige de todos os seus autores que revelem conflitos financeiros.
O estudo em questão foi liderado por Beatrice Golomb, da Universidade da Califórnia em San Diego, e assinado por mais dois colegas. Todos trabalharam apenas com financiamento público. Lê-se que “os autores declaram não ter conflitos de interesse a revelar, mas professam um anti-conflito por meio de seus hábitos de compra de chocolate”, o que pode ser constatado na foto acima, distribuída pelo departamento de comunicação da UCSD.
Se o único viés dos cientistas é o gosto por trufas e bombons, vale a pena ver o que têm a dizer. A frase de efeito usada por Golomb para divulgar seu trabalho é revelada de maneira honesta logo de cara, com o estudo explicando que a “frequência” de consumo não estava relacionada à “quantidade” de chocolate ingerida pelas pessoas analisadas no estudo. Ainda assim, o trabalho tem algum mérito.
A pesquisa foi basicamente construída sobre entrevistas com voluntários –1.108 pessoas entre 20 e 85 anos– que revelavam quantas vezes comiam chocolate por semana. Para evitar correlações falsas, também foi estimado o consumo médio de calorias e o grau de sedentarismo das pessoas. Ao final, descartados fatores de confusão, o resultado da pesquisa de fato têm boa significância estatística.
Mas o que esses estudos assim, que tentam associar um fator a outro de maneira agnóstica, permitem concluir? Pesquisas sobre nutrição como esta são produzidas em escala industrial, mas quão boas elas são em apontar causalidade, em provar que X ocorre em função de Y?
O que o trabalho de Golomb leva a imaginar é se aspectos sociais e psicológicos não estão por trás do resultado inusitado.
É possível que as pessoas mais magras entrevistadas no estudo estivessem consumindo chocolate com mais frequência por terem menos sensação de culpa? Uma barra de 80 gramas de chocolate tem mais ou menos a mesma quantidade de calorias que um prato cheio de arroz, mas é bem possível que cause mais arrependimento numa pessoa que deseje emagrecer.
Outro fator a se considerar é se o nível de renda não está por trás das conclusões. Chocolate realmente bom é uma iguaria cara e, em países bem abastecidos, a pobreza e o baixo grau de instrução estão relacionados à alimentação mal balanceada.
A explicação oferecida por Golomb para o efeito verificado, porém, é que outros estudos já mostraram correlação entre chocolate e o que ela chama de “bons indicadores metabólicos” –pressão sanguínea, nível de colesterol e sensibilidade à insulina. Como esses fatores também estão relacionados ao índice de massa corporal, ela sugere que um teste clínico mais rigoroso sobre consumo de chocolate seja realizado para tirar a dúvida.
OK. É honesto por parte de Golomb concluir que alegações mais ousadas dependem de estudos mais aprofundados. É possível que a hipótese dela esteja correta, e todos os apreciadores de chocolate do mundo ficariam felizes se isso ocorrer. Mas será que essa felicidade também não é um fator de viés a se considerar?
Na dúvida, comi dois tabletes de chocolate amargo hoje e encerrei a cota. Não acho que um terceiro me faria tão mais feliz.
Fantástico esse blog. É maravilhoso ver a verdadeira ciência sendo colocada em prática, não só apresentando artigos científicos, mas questionando cada ponto relevante sobre a conclusão dos cientistas.
Afinal, somente questionando as premissas é que se pode fazer ciência de verdade.
Eu sou chocolatra assumida. Dificilmente passo um dia sem comer um tablete, esses de 180g. Tenho 1,65cm e estou sempre entre os 52 a 54 kg.
Parabéns! Entretanto uma amostra dentro do universo da população nao anima ninguém a comer 180 g de chocolate/dia sem se preocupar em engordar.
Texto complicado e ininteligível. Melhorem. Está chatíssimo de ler e sem uma conclusão clara.
Seria importante separarmos o joio do trigo, digo, o cacau da gordura. É uma generalização um tanto quanto cruel chamarmos pelo mesmo nome (chocolate) duas coisas tão diferentes, isto é, o chocolate de verdade e aquela ração industrial com 7% de cacau e 93% de açúcar e gordura.
Disse-me uma vez um grande mestre confeiteiro: “o chocolate fajuto, esse do mercado, baratinho, é uma guloseima; já o chocolate de verdade é um alimento”.
Aliás, se não me engano, os parâmetros da indústria brasileira preveem no mínimo 7% de cacau na formulação. E, obviamente, é o que as indústrias praticam. 7%! É ridículo.
Resultado: a páscoa é um festival de gordura e açúcar. Salvo para a burguesia palaciana, para os dedicados apreciadores do bom chocolate ou para os grã-finos — que podem gastar 15 pratas em uma barrinha de 100g… É complicado, tchê.
Ótima leitura sobre o artigo e excelente exploração do tema.
Eu acredito que as abordagens de artigos científicos devem passar um levantamento completo dos autores, financiadores e objetivo da pesquisa, especialmente quando o assunto abordado possui uma enorme relação econômica; como a industria do chocolate.
Parabéns.
Muito interessante a discussao. Fico feliz de ver que esse jornal ainda eh capaz de publicar assuntos interessantes e construtivos, apesar da boa porcentagem sobre “estrelas da tv”.
Quanto ao texto, qualquer estudo cientifico gera sempre mais perguntas. Assim que funcionam os laboratorios, caro autor, cada um faz somente uma pequena parte. Ninguem consegue publicar um paper exclarecendo todas as duvidas.
O autor, no entanto, esta certo de discutir os pontos criticos. Nesse mesmo estudo foram excluidos pacientes com doencas cardiovasculares, diabetes e dislipidemia. Portanto, pessoas com essas e outras comorbidades deveriam refletir melhor antes de consumir chocolate da forma que o estudo sugere.
Acho valida a critica do autor, porem, eh necessario ter um maior conhecimento cientifico para poder fazer um comentario desses. Proponho ao senhor publicar em uma revista cientifica com fator de impacto acima de 10, e depois aceitarei seus comentarios. Meta-analises sao muito controversas, mas sao validas, e principalmente, dados provenientes desses estudos sao sempre muito divulgados.
Oi Rafael. Parabéns pelo blog, estou acompanhando sempre e gostando muito.
Como jornalista, também fiquei com um pé atrás em relação a pesquisa. Especialmente porque estou trabalhando uma pauta sobre o assunto e acho fundamental que haja responsabilidade na divulgação de informações que tenham relação direta com a saúde das pessoas (aliás, responsabilidade devemos ter independente da editoria).
Pois bem, conversei com uma nutricionista (Roseli Rossi) sobre esse assunto. E ela afirma que é possível emagrecer consumindo chocolate. Mas há critérios. Primeiro, essa regra vale para chocolates ricos em cacau (a partir de 70%). Segundo, para obter os benefícios que o chocolate promove não é necessário consumir mais do que 15 a 30 gramas. E, por fim, o hábito de consumir chocolate diariamente só é vantajoso se for mantida uma alimentação equilibrada.
Outra informação importante, que não li nas matérias feitas sobre essa pesquisa, é que o chocolate é um dos alimentos com maior poder termogênico. Comer é uma das atividades diárias do nosso organismo que mais nos faz queimar calorias, o poder termogênico basicamente se resume a isso. E o chocolate é poderoso nesse aspecto.
Ela até diz que é possível comer um pedaço de chocolate ao leite, uma vez ou outra, mas sempre atentando para a quantidade e se possível em conjunto com o amargo.
Por outro lado, consumindo chocolate em exagero, assim como o café, você pode sofrer o reverso dos benefícios. Como tudo na vida, a diferença entre remédio e veneno está na dose!
Sucesso com o blog!